Ilustrações de Lula Côrtes e poemas de Cristiano Jerônimo
O Portal Flores no Ar compartilha com os leitores um rico material artístico presenteado pelo jornalista e poeta Cristiano Jerônimo. São poemas do próprio Cristiano e ilustrações do grande artista Lula Côrtes, que fazem parte do livro ‘Redenção de poeta’, lançado em 2008.
Cristiano conta que Lula recebeu todos os poemas do livro e escolheu nove textos que resultaram em nove aquarelas com medidas de 0,70m X 1m, além de outra, a décima ilustração, que foi concebida – em conceito – junto com Cristiano, ilustrando a capa do livro.
“Neste nosso trabalho, a ilustração da capa está legendada pelo poema ‘Necessárias’, que foi musicado por Lula Côrtes, durante os trabalhos, para fazer parte do álbum triplo, o CD Tarja Preta, que Lula Côrtes não chegou a gravar. Não deu tempo, infelizmente”, conta Cristiano.
As fotos de reprodução foram do repórter fotográfico João Carlos Lacerda.
A técnica usada por Lula é de aquarela sobre papel canson.
A(E)s(x)ILADAS
As mulheres de boa idade
Nos ensinam a viver a vida
Moram na casa ao lado
E esperam o dia passar logo
Enquanto a vida demora
Nas páginas dos jornais.
Pequenas edificações e carros
Testemunham a paz da beira do lago.
É quando vejo cinco ou seis velhas
Senhoras de boa idade sentadas à TV.
As mulheres vizinhas de boa idade
Vivem longe das suas famílias
Sem saber que enquanto esperam viver
Os dias passam lentos para morrer.
Asiladas em seus mistérios
Lúcidas, apavoradas e risonhas.
Aos domingos sentam-se na sala
Para esperar a hora do almoço
Sem os filhos
Sem os netos
Que um dia
Ajudou a vesti-los…
EXPANDEM
Para a praia de ônibus no domingo
Com as caras livres nas paradas
O calor que incendeia o dia-a-dia
Te conduz à música e ao futebol
Ligadas parabólicas antenas e sirenes
E as mazelas indesejáveis do sistema
Cuja alma eu tentava em meus poemas
E a noite, às vezes, muito me entristecia.
Embora eu soubesse ser passageiro,
À noite, mais à vontade eu poderia
Motorista do caminho me escolher;
Passeando sempre entre os jardins
Me molhar com as gotas da chuva
Com o deslizar do vento na alma
Correr pastos íngremes desatentos
Pela mais nobre e solitária instigação
Do sabor humano no sentido da vida
Azul, belo, espiritualista e soberano.
Repetido frias vezes pelo zelo controvertido
Ante as velas coloridas do meu pensamento
Preto e branco no sorriso turvo e inflamável
Que guardaram para marcar o fim dos dias
E, na compenetração da aura, explodir no fim
Transformado em partículas que se expandem.
E se reconstituem automaticamente ao pensamento,
Aos chamados soberanos das nossas mentes.
IMENSIDÃO
Neste dia a noite fria
Pergunta aonde foi que errei
E eu nunca pensei ou quis
O que não dependesse de mim ser feliz.
Passa por dois peitos
E pelo medo do além
A tranqüilidade
De se querer bem.
Sem culpas e sem mágoas
Como águas que deslizam
Aqueço-me no teu frio
Esqueço-me e me arrepio…
Nesta noite não há dia
Há menção à alegria
Esperanças no caminho
Perante a imensidão!
NECESSÁRIAS
Certezas são noites escuras sem insônias
São acertos bem feitos de coisas errôneas
São rios caudalosos em correntes ao mar
Nos dias mais felizes das tardes tristonhas!
Dúvidas são crises parcas de meros egoísmos
Quando temos que optar entre nós e o altruísmo
São açudes que enchem para um dia secar
Nos invernos mais escuros que os eclipses…
Verdades são coisas elucidadas em momentos
Atualizadas pelos inquietos e toscos sentimentos
Que nos servem muitas vezes de algum alento
Quando, não em vão, tentamos nos encontrar…
Mentiras são coisas reticentes necessárias
Quando, por razões óbvias, queremos preservar
São coisas erradas que fazem bem e vice-versa
São razões de muitas conversas em ondas no mar
Coragem é a capacidade de assumir nossos erros
De sermos humildes perante também aos acertos
Nos períodos de luto ou nos tríduos momescos
Na hora em que tudo diz que é para a gente parar…
Covardia é se esconder da verdade mais latente
É abrir mão, diariamente, de sermos mais gente
Como é essa capacidade de ocultar o indigente
Que somos obrigados no espelho a todo dia olhar!
SEGREDO DO TEMPO
O poder que procuro
Não está por trás do birô
Reside no segredo do tempo
Idos e vindos, já passou
A arma que alimento
Não e letal nem feroz
E um grito da garganta
O soltar da minha voz
A sombra que descanso
Não é penumbra ou solidão
É o abrigo do remanso
Ventilando o coração
O ouro que preciso
Não ilude nem se furta
Não nos bota em perigo
Não aborrece nem assusta
O ouro reside no segredo do tempo…
SEM MAL
Nos intervalos da vida feia
Constatei a beleza do simples
Entre as aranhas e suas teias
Ouvi inúmeros tons e timbres.
Dentro do panorama sertanejo
Alguém ofuscou de ódio a beleza
E no alto da serra, ouvi três lampejos.
Clarearam sem o sol a natureza…
Fiquei sem entender estes meninos
Tentei, o dia inteiro eu ouvindo
Os teoremas simples, mas perfeitos.
E no açude seco e ébrio do sertão
Olhei para a cara de um grande irmão
E só no mal descobri defeitos.
LIVRE!
Eu moro numa cidade
Que não sei pra onde vou
Inibido de facilidades
Vou ao fundo do que sou.
Tem azul e esperança,
Matas verdes e crianças
Brinquedos de verdade
Nunca quebram, vaidade.
Vi no mar a tua brisa
Serena à beira a lumiar
Sei do que tu precisas,
Dunas mansas pra deitar.
Sei do medo corriqueiro,
Das sementes dos coqueiros,
A tua praia e o teu mar…
Assim moro numa cidade
Que descubro a cada olhar
Toda vez que a vida prova
Sobre o rio caminhar…
Muitas vezes nada sobra
Do que estava pra chegar.
PINTO A VOZ
Vestido de branco, eu quero paz.
De azul, escrevo nossa alegria.
De marrom, a dor que a vida trás.
E vermelho, protejo as fantasias.
Tudo pode ser visto no arrebol
A mixagem do laranja, em agosto.
A fotografia do brilho do sol
Iluminam nossa mente e rosto.
Na cromoterapia das vidas passadas
Reside a cura e a renovação da alma
E do verde das nossas matas derrubadas
No mar de tons e ilusões deturpadas
Sou pássaro vinho na imensidão
Voando em cores, eu pinto a voz.
DOIS
O conjunto dos dois é determinante para a potencialização das forças energéticas criadas pelo amor como energia bipolar que vibra em seqüência; em ondas de rádios e invernos
A soma das tuas bocas superam um milhão de beijos e teu mel protege a minha garganta
Que uso na fala e sinto teu cheiro.
Assim: como você queira!
TODO DIA (MOTOTRILHA)
A vida é como o obstáculo de uma trilha de motocicleta; onde, depois de descer o barranco, entramos na lama grossa atolando. Ainda temos que subir uma estrada escorregadia…
Podemos achar que não conseguimos. Mas é preciso tentar…voltar, embalar de novo, subir…e ver que, depois de todo esse trabalho, há uma paisagem e um céu azul, estampado e maravilhoso – com ventanias.
E a montanha desce, o rio aparece e a lama encrosta, parecendo que a gente não vai resistir…
Mas, uma força maior vinda de Deus, oriunda do Cósmico, faz com que a gente prossiga, com que a gente insista! A nossa motocicleta se mantenha viva; forte com seu ronco, este ronco da vida…
Quando a gente dorme e acorda, percorre outra trilha, pois até o mesmo caminho nunca será igual; nem aos domingos, nem às quartas-feiras, nem todas as besteiras que aconteceram irão permanecer…
Pois o dia de hoje é igual ao sol: nasce de novo todos os dias…
Saiba mais sobre Lula Côrtes aqui!
Belíssima homenagem a Cristiano Jerônimo e a Lula Côrtes. A arte se expande e agradece ! Parabéns Flores no Ar!
Não conhecia esse lado de Lula Cortês, Belíssimas peças