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[CONTO] No fluxo da vida

| Por Daniella Freitas |
(freitas27daniella@gmail.com)

Encontrou uma carta, entre os muitos folhetos de publicidade, na caixa do correio. Há quanto tempo não recebia uma dessas? Um envelope padrão, sem remetente, com o seu nome escrito à mão, em letra de forma.

O calor estava grande. Sentou na varanda para abrir o envelope e saber do que se tratava. A letra não era das melhores, mas legível. Leu, releu, leu outra vez a declaração simples e perturbadora, assinada por “Rui”.

Ela sabia que conhecia alguém com esse nome. Começou a puxar pela memória. Buscou “Rui” no seu local de trabalho, nos amigos dos amigos, nos colegas do curso de meditação, iniciado há pouco tempo. Nada.

Só à noite, já deitada, conseguiu ligar o nome à pessoa. Tomou um susto. Nunca havia recebido uma carta de amor antes, e agora aquele “alguém”, que parecia tão improvável, esperava uma resposta sua.

Levantou e foi até à janela. Queria lembrar a fisionomia do seu admirador. Trocou algumas palavras com ele nas duas reuniões que os moradores fizeram para discutir uma onda de assaltos. Quando se cruzavam, no vai e vem cotidiano, um cumprimento sempre foi o bastante, pelo menos para ela.

As luzes estavam apagadas na casa da frente. A rua estava tranquila, assim como a sua vida. Ela vivia uma fase leve, e gostava disso. Era livre. Estava bem consigo mesma e não cogitava fazer nenhum esforço para alcançar o ideal de mulher criado por um homem.

Respirou fundo. Pediu calma ao seu coração. Sabia muito pouco sobre “Rui”. Ele podia ser um cara interessante. Trazer para ela um Universo novo. Um novo Sol, uma nova Lua, um sabor diferente na maturidade, sem expectativas ou fantasias românticas. “Eu quero a sorte de um amor tranquilo…”, já dizia a canção.

O seu vizinho tinha os cabelos brancos e o rosto marcado pelo tempo. Ela pensou em como seria o beijo, o sexo, as mãos entrelaçadas. Abriu a janela e sentiu o ventinho da madrugada. Lembrou as palavras escritas de próprio punho. No outro lado da rua, naquela paisagem que parecia ser a de sempre, havia algo novo.

Voltou para a cama. Dormiu. Acordou certa de que tinha sonhado, mas a carta estava ali, na mesinha de cabeceira. Tomou um banho gelado para encarar o dia.

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