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Livro ‘Filosofia da Liberdade’, de Rudolf Steiner, foi tema de encontro em São Paulo

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Por Júlio Lins

Um grupo especial de pesquisadores, gestores, professores e médicos se reuniram para compartilhar o que é vivo em cada um dos conceitos apontados pelo livro ‘Filosofia da Liberdade’, de Rudolf Steiner. No inspirador salão multicolorido de arquitetura orgânica da Sociedade Antroposófica no Brasil (SAB), na cidade de São Paulo, em setembro de 2016, esse grupo compartilhou suas imagens mentais procurando ir além das embalagens e se encontrar nos conceitos que podem como tal ser repensados por todos.

Para esse primeiro encontro de aprofundamento a diretoria da SAB convidou dois dos profissionais que reconhecidamente se dedicam ao ensino dessa temática: Claudio Bertalot e Rogerio Calia. Claudio Bertalot, euritimista e violoncelista, é a referência para as formações em filosofia da liberdade para as profissões antroposóficas nas últimas décadas. Rogério Calia é professor doutor de administração da USP, seu trabalho embasado na filosofia da liberdade traz propostas práticas de como implementar ações genuínas nas organizações, a partir de estudos de casos que observou na Alemanha.

Ambos compartilharam a coordenação da roda de diálogo, que contou também com a preciosa presença de Dr. Derblai Sebben, um dos três secretários gerais da sociedade antroposófica no Brasil; Christian Schües fundador do instituto EcoSocial; e Julio Lins professor de medicina da UFPE, fundador do Programa Atentamente de práticas meditativas no SUS e autor do presente texto.

Claudio Bertalot deu o tom da conversa com a delicadeza na fala e nos movimentos, abriu a roda na manhã do sábado com a observação de que, apesar de seus esforços para entusiasmar as pessoas para a leitura do Filosofia da Liberdade, as pessoas não parecem estudar o livro. E abriu com o exame da ação consciente, tema do primeiro capítulo do livro citando Guimarães Rosa “toda ação principia em uma palavra pensada”. Compartilhou sua perspectiva única de quem vive a antroposofia desde criança e estuda o tema desde os 18 anos. Diz com sorriso jovial que “sabia que tinha algo muito legal na base daquilo tudo”. Ressoou para quem o ouviu a seguinte pergunta: Como entusiasmar as pessoas para o esforço necessário ao amor pela filosofia da liberdade? Como colaborar para a vivência experimental da estrutura da realidade?

Rogério Calia procurou trazer em uma linguagem contemporânea, uma forma de aplicação prática das consequências dessa filosofia. Comenta como uma organização precisa proteger o impulso individual, pois daí vem o progresso cultural/espiritual e exemplifica com multinacionais que já conseguem criar esse ambiente necessário à criatividade e como em instituições pedagógicas esse apoio ao nascimento de novas ideias não está acontecendo.

Ao contemplar uma ação genuína nossa, encontramos a possibilidade de contemplar o mundo e compreender a mim mesmo, podemos então passar a empreender conscientes o nosso eu e empreender a partir daí uma comunidade de espíritos livres. Ressoou para quem o ouviu: Como as pessoas podem ir além das embalagens de suas imagens de ação e se encontrarem nos conceitos?

A imagem mental é um conceito individualizado, diversas imagens podem surgir de um único conceito. A partir da observação pensante, a atividade intuitiva relaciona percepções na formação dessas imagens mentais. Se as pessoas ficam no nível de suas imagens mentais, ou seja, nos “embrulhos dos conceitos” elas discordam sem achar base comum de onde partir o diálogo e a decisão conjunta genuína. Se as pessoas fazem o esforço de procurarem os conceitos implícitos nas imagens mentais e se encontrarem aí, que é uma características de espíritos livres, podem encontrar o diálogo desde que tenham desenvolvida a capacidade de formar imagens de ação a partir de si mesmos.

Esse termo “imagens de ação” é um bom exemplo do trabalho do professor Rogério Calia. Na tradução em português do Filosofia da Liberdade o termo usado é “fantasia moral”, ou seja, a habilidade cognitiva de formar imagens de como agir em uma situação individual a partir de conceitos universais. Ele explica como o termo “fantasia moral” é mal compreendido por quem não está familiarizado com filosofia e como o termo “imagem de ação” facilita o entendimento. Segundo Claudio Bertalot, esse é o ponto forte que vê no trabalho de Rogério Calia: “simplificar para frutificar”.

As obras de Rudolf Steiner são ricas em joias preciosas que agregam pesquisadores ao redor de linguagens em comum, abrangendo os mais diferentes impulsos culturais/espirituais humanos. Segundo o próprio Steiner, o maior diamante é a filosofia da liberdade, pois aponta diretamente para o pensar vivenciado e o faz no diálogo com a consciência da atualidade. Em uma linguagem laica, que desafia tanto visões materialistas ingenuas como religiosas metafísicas, essa obra exige a coragem de pensar por si mesmo e sair de lugares aparentemente confortáveis e sem liberdade no realismo metafísico: tanto do religioso que acredita em um deus antropomórfico, que determina o sentido da vida dos humanos e exige obediência a sua vontade; como do materialista que acredita a priori que tudo está determinado mecanicamente e ingenuamente aceita algumas percepções e não outras, na construção de uma visão de mundo acomodada e desresponsabilizada. Aliás, talvez por isso o livro não tenha sido mais amplamente estudado no século passado, pois incomoda a ambos os lados da polarização moderna.

A diretoria da Sociedade Antroposófica do Brasil está de parabéns por apoiar o estudo dessa obra central, que tem tanto a contribuir para a ciência contemplativa. Belos frutos desse encontro de aprofundamento já estão surgindo no grupo de trabalho para o ensino da filosofia da liberdade nos cursos de formação das profissões antroposóficas, e em especial nos cursos para gestores de iniciativas sociais. Que no século XXI, a Filosofia da Liberdade encontre terreno para frutificar e que os professores que se dedicam a sua divulgação sejam precisos em suas apresentações e propostas de exercícios, para que o conteúdo vivido possa ser o reconhecimento direto da natureza da atividade pensante e que mais e mais pessoas possam decidir genuinamente. Isso é perfeitamente possível já que “o pensar devidamente vivenciado já é uma experiência espiritual” (STEINER- Filosofia da Liberdade).

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